Rui Melo: “Quero fazer coisas que me belisquem.”

Voltámos às ruas do Poster para desconstruir a arte de Rui Melo e o trabalho que fez dele um dos 10 vencedores da Open Call desta edição.

Numa galeria a céu aberto, não há princípio nem fim para qualquer que seja a exposição. Ou melhor, é o visitante quem decide onde ela começa e acaba. Porém, se a exposição for o Poster, existe uma exceção que confirma a regra: a visita guiada no dia da inauguração. Aí há sempre um princípio e nesse princípio, que é um lugar (este ano foi Rua do Açúcar) está o poster de Rui Melo. “Achei muito engraçado terem-no colocado ali, no começo – que também pode ser o fim, se fizermos o percurso inverso”, comenta o Brand Designer. Soube da Open Call pela Internet um mês antes de terem aberto as candidaturas: “Fiquei logo com vontade de participar. A princípio, tive vontade de fazer algo mais artístico, mas atirei-me para uma peça conceptual.” A peça convida-nos a refletir sobre o próprio conceito de arte conceptual, descrevendo-se a si própria: “neste caso, por texto, o que a torna mais crua”, explica com um sorriso, “o mesmo que eu gostava que as pessoas sentissem quando começassem a ler. Acho imensa graça a estas mensagens que desafiam a pessoa, com este tipo de diálogo.”

Rui Melo é um curioso por natureza. Gosta de ser surpreendido pelo aleatório, mas reconhece que mais de 20 anos a trabalhar em grandes agências, logo, em projetos que envolvem um conceito e servem um propósito, transportam para as suas criações o vício da segurança, encerrando no produto final um paradoxo: “Por muito livre que queira ser na expressão, por muito que queira só atirar um balde de tinta para cima de uma superfície e ver o que é que aquilo dá, gera-se essa dificuldade… Portanto, participar neste género de ações é uma das coisas que gostava de ter mais tempo para fazer.”

Formou-se no IADE em 1994 e fez o seu percurso no Design, passando por todas as etapas até à de Diretor Criativo, na Havas, e, mais tarde, na Ogilvy. Nessa altura, deu workshops na Restart e lecionou Brand Design na Escola Superior de Comunicação Social. Agora, procura “algo diferente” que explore arte, cultura e meios ainda por imaginar: “A verdade é que, ao trabalhar para organizações, nós não estamos a seguir propriamente o nosso caminho. Temos de cumprir determinadas regras. Ficou sempre no ar aquele ‘Um dia vou fazer o que apetece. Um dia vou fazer coisas que me belisquem, que me vão entretendo, que me vão alimentando esta intenção criativa.’” Esse dia é hoje e é cada vez mais um dia insatisfeito, à imagem da própria Arte: “Hoje fazemos uma peça e amanhã já não estamos lá. É um processo duro… sentirmo-nos satisfeitos com a insatisfação.” O que nos leva a outra questão: se o Poster 2020 fosse hoje, estaria Rui Melo satisfeito com a sua obra, rever-se-ia nela? “Provavelmente não. E tenho quase a certeza de que irei tornar a concorrer.” Assim esperamos.

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